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(FOLHAPRESS) – Em “Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo”, de 2009, um homem em viagem pelo interior do Nordeste lê uma carta dirigida à sua amada.

“Marinheiro das Montanhas” é quase a mesma coisa, mas ao contrário. O homem aqui tem nome –Karim–, viaja voluntariamente à Argélia para conhecer a terra de seu pai. Também nos lê uma carta, mas dirigida a Iracema, mistura de sua mãe, que já morreu, com uma interlocutora imaginária.

A primeira parte da viagem é por navio, aquele que o leva através da enjoativa instabilidade do mar. O que mais se agita? O mar ou a câmera? Talvez seja o viajante mesmo o mais agitado. É por conhecer a sua origem, ou metade dela.

É a terra de Majid, o pai que raramente viu ao longo de sua vida. A mãe, brasileira, o conheceu quando tinha uma bolsa de estudos nos Estados Unidos. Se apaixonaram. Dessa união nasceu Karim. Então veio a política. No Brasil, o golpe de 1964 e a ditadura. Na Argélia, a luta pela independência e a conquista da independência. Por ela, Majid volta.

Majid, esse estranho. É como o sente. A separação é o que tanto inquieta o menino. Porque é a imaginação de garoto que elucubra a separação. Ele está diante da mãe –e destinatária da carta– e pergunta o que ela sentiu. O que ela, afinal, sentiu durante toda a vida? Ela, cientista –bióloga, presumo–, que o criou, de quem foi íntima, mas nem tanto. Nunca ousou perguntar a ela o que sentiu depois do abandono, como sobreviveu.

Algo se nota. Nas imagens de juventude, nos Estados Unidos, ela sorri com facilidade. Depois, não. O filho parece que partilha sua solidão e a duplica pelo desterro. Chega ao país do pai, mas não o reconhece como seu. Está longe da mãe e também do pai, que mora em Paris, que casou outra vez, que teve cinco filhos. Karim o encontra em Paris. Sente o pai ainda mais estranho depois que o conhece. Majid é um estranho como qualquer outro.

Argel é só uma escala, mas ali é ele, Karim, que é o estranho. Argel é uma escala de estrangeiro, de desconhecido, de turista. Seu destino são as montanhas da Cabília. Ali ele finalmente é reconhecido. Ali não precisa mesmo soletrar o nome Aïnouz. Todos conhecem. Ali está a família do pai, os parentes do pai. Um encontro familiar em que vigora, de início, o estranhamento. Essa gente da montanha é diferente da urbana.

Desde então, o filme se faz de aproximações, as montanhas da Cabília, sua gente –os parentes, mas não só–, a correspondente imaginária –a mãe, Iracema–, o pai. Como se o estranho e o familiar, o presente e o ausente, encontrassem uma espécie de reconciliação na figura dessa voz que foge do fundo de uma carta.

Uma “espécie de”, não uma reconciliação, porque, no final das contas, o triângulo pai-mãe-filho não se fecha nunca nem consola a melancolia do filho. Ela é que o constitui. Também não restituirá o pai. Não consolará o sofrimento da mãe pela separação –que é, no mais, presumida pelo filho.

O que resta? O percurso. E nele a beleza de transformar o desconhecido em conhecido, de pisar o lugar da origem (o outro lugar), o descobrir que a dor da existência não se cura.

O de saber da inutilidade da viagem. Ele viaja porque precisa, esse é um imperativo íntimo, mas volta porque a viagem tem de terminar.

O desterro prossegue. Karim voltará e não encontrará a mãe nem ninguém que o console. De tudo restarão as imagens. Para isso existimos, talvez. Para que tudo se converta em imagem, ou escrita. Belo filme.

MARINHEIRO DAS MONTANHAS

Quando: Estreia em 28 de setembro

Onde: Alemanha, Brasil, França, 2021.

Classificação: 14 anos

Direção: Karim Aïnouz

INÁCIO ARAUJO / Folhapress

Filme de Karim Aïnouz mostra a beleza de conhecer o desconhecido

(FOLHAPRESS) – Em “Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo”, de 2009, um homem em viagem pelo interior do Nordeste lê uma carta dirigida à sua amada.

“Marinheiro das Montanhas” é quase a mesma coisa, mas ao contrário. O homem aqui tem nome –Karim–, viaja voluntariamente à Argélia para conhecer a terra de seu pai. Também nos lê uma carta, mas dirigida a Iracema, mistura de sua mãe, que já morreu, com uma interlocutora imaginária.

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A primeira parte da viagem é por navio, aquele que o leva através da enjoativa instabilidade do mar. O que mais se agita? O mar ou a câmera? Talvez seja o viajante mesmo o mais agitado. É por conhecer a sua origem, ou metade dela.

É a terra de Majid, o pai que raramente viu ao longo de sua vida. A mãe, brasileira, o conheceu quando tinha uma bolsa de estudos nos Estados Unidos. Se apaixonaram. Dessa união nasceu Karim. Então veio a política. No Brasil, o golpe de 1964 e a ditadura. Na Argélia, a luta pela independência e a conquista da independência. Por ela, Majid volta.

Majid, esse estranho. É como o sente. A separação é o que tanto inquieta o menino. Porque é a imaginação de garoto que elucubra a separação. Ele está diante da mãe –e destinatária da carta– e pergunta o que ela sentiu. O que ela, afinal, sentiu durante toda a vida? Ela, cientista –bióloga, presumo–, que o criou, de quem foi íntima, mas nem tanto. Nunca ousou perguntar a ela o que sentiu depois do abandono, como sobreviveu.

Algo se nota. Nas imagens de juventude, nos Estados Unidos, ela sorri com facilidade. Depois, não. O filho parece que partilha sua solidão e a duplica pelo desterro. Chega ao país do pai, mas não o reconhece como seu. Está longe da mãe e também do pai, que mora em Paris, que casou outra vez, que teve cinco filhos. Karim o encontra em Paris. Sente o pai ainda mais estranho depois que o conhece. Majid é um estranho como qualquer outro.

Argel é só uma escala, mas ali é ele, Karim, que é o estranho. Argel é uma escala de estrangeiro, de desconhecido, de turista. Seu destino são as montanhas da Cabília. Ali ele finalmente é reconhecido. Ali não precisa mesmo soletrar o nome Aïnouz. Todos conhecem. Ali está a família do pai, os parentes do pai. Um encontro familiar em que vigora, de início, o estranhamento. Essa gente da montanha é diferente da urbana.

Desde então, o filme se faz de aproximações, as montanhas da Cabília, sua gente –os parentes, mas não só–, a correspondente imaginária –a mãe, Iracema–, o pai. Como se o estranho e o familiar, o presente e o ausente, encontrassem uma espécie de reconciliação na figura dessa voz que foge do fundo de uma carta.

Uma “espécie de”, não uma reconciliação, porque, no final das contas, o triângulo pai-mãe-filho não se fecha nunca nem consola a melancolia do filho. Ela é que o constitui. Também não restituirá o pai. Não consolará o sofrimento da mãe pela separação –que é, no mais, presumida pelo filho.

O que resta? O percurso. E nele a beleza de transformar o desconhecido em conhecido, de pisar o lugar da origem (o outro lugar), o descobrir que a dor da existência não se cura.

O de saber da inutilidade da viagem. Ele viaja porque precisa, esse é um imperativo íntimo, mas volta porque a viagem tem de terminar.

O desterro prossegue. Karim voltará e não encontrará a mãe nem ninguém que o console. De tudo restarão as imagens. Para isso existimos, talvez. Para que tudo se converta em imagem, ou escrita. Belo filme.

MARINHEIRO DAS MONTANHAS

Quando: Estreia em 28 de setembro

Onde: Alemanha, Brasil, França, 2021.

Classificação: 14 anos

Direção: Karim Aïnouz

INÁCIO ARAUJO / Folhapress

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